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Record Store Day - O primeiro disco a gente nunca esquece

Para comemorar o Record Store Day, que acontece hoje, 16 de abril, recupero texto perdido de outra encarnação do Caixa Preta. Fica como homenagem a todas as lojas que mantêm viva a cultura do disco e também ao autor, Ronnie James Dio (1942-2010).


Ele está comigo há 30 anos. Perdido no meio de outros tantos LPs e ausente há bastante tempo do meu relativamente ativo toca-discos. E hoje resolvi dar-lhe uma chance. Enquanto a agulha desliza pelos sulcos do vinil, lembranças do ginásio e de toda uma época vão saindo do baú das memórias.

Meu primeiro disco foi adquirido com economias e trocados de viagens de ônibus, o famoso 5131-Praça da Sé, que me levava até o colégio. Já havia alguns anos que gostava de rock. Era refém dos poucos programas de clipes, o mais saudoso deles o Som Pop, da TV Cultura, que vez ou outra exibia filminhos de bandas de hard rock e heavy metal. Nada mais fascinante para um adolescente de 13 anos e que adorava o som de guitarras elétricas. Mas numa noite de domingo qualquer, foi o eterno programa Fantástico quem fez a surpresa: anunciaram para depois do intervalo um "musical" do ex-vocalista do Black Sabbath. À época, o departamento de jornalismo da emissora ainda não tinha aderido ao termo video-clipe, mas para mim não fazia diferença: a simples menção ao nome da banda sagrada fez meus olhos pularem das órbitas.

O locutor global anunciou "The Last in Line" como a ideia do cantor Ronnie James Dio sobre o fim do mundo e terminou o texto com uma tradução livre do título: "O Fim da Linha". O estrago estava feito. Imagens de um elevador que despenca até o inferno, a trilha musical recheada de riffs e solos faíscantes e toda aquela ideia de fim dos tempos me fascinaram. Lembre-se que era 1984 e existia ali um componente de rebeldia em relação à ordem das coisas. Para as FMs brasileiras, pré-Rock in Rio, a maior ousadia ainda era tocar coisas pavorosas como o grupo pop-rock Radio Taxi. E a TV, salvo o oásis do Som Pop, era ainda tão sem graça quanto hoje, embora com apenas cinco emissoras.

Da veiculação de "The Last in Line" no Fantástico até a compra do disco lá se foi quase um ano. Acumulei trocos da cantina do colégio e os somei às moedinhas que sobravam das viagens de ônibus, que eu normalmente pagava com passe escolar. O que faltava para adquirir o LP, provavelmente foi conquistado graças à eterna generosidade maternal.

Com o dinheiro contado, lá fui eu, a bordo do 5131, dessa vez até o ponto final, na Praça da Sé, atrás de meu primeiro disco. A loja escolhida foi a filial da Rua 7 de Abril da outrora importante rede Museu do Disco. Garimpei em cada casulo de vinil até me deparar com a capa em tons pastéis criada por Barry Jackson - o mesmo que assinara a arte do então recém-lançado "Afterburner", do ZZ Top. Naquele vinil estava não apenas a canção que iluminou um final de domingo qualquer, mas também, e principalmente, minha definitiva introdução aos prazeres do rock'n'roll.

Trinta anos depois, meu primeiro LP está girando no toca-discos. Orgulhoso, tenta disfarçar o efeito do tempo e deixa a agulha deslizar tranquila, sem reproduzir qualquer chiado, talvez na esperança de que seja tocado com mais frequência em minhas sessões nostálgicas.


O saudoso Ronnie James e seu guitarrista, o norte-irlandês Vivian Campbell, quebram tudo no clipe exibido para todo o Brasil em 1984

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PS: Caso esteja se perguntando, sim, a imagem que abre o 'post' é do meu próprio LP. Repare no encarte consertado com durex. :)

Violência nos palcos: quando a plateia é o alvo

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Repercutiu hoje na Internet, de blogs a canais como o Noisey, da Vice, a agressão sofrida por uma fã durante show do conjunto pop-punk The Story So Far.

Aconteceu em Toronto, no Canadá, e o vídeo não é bonito de se ver (link no final do post). Em um rompante de imbecilidade e auto-indulgência, o vocalista Parker Cannon desferiu uma voadora nas costas de uma jovem que, sem qualquer noção de espaço, preparava-se para tirar uma 'selfie' sobre o palco. A solução do cantor, no entanto, extrapolou os limites do razoável e funcionou como uma estúpida demonstração de misoginia.

Impossível não lembrar como Ian MacKaye, cofundador do Minor Threat e artífice da cena straight edge, se comportava diante de inconvenientes durante os shows. Nas quatro ocasiões em que vi o Fugazi ao vivo, entre 1994 e 97, MacKaye interrompeu a apresentação em algum momento para encerrar a baderna de fãs em cima do palco. Dava um caprichado sermão e a banda logo emendava a canção de alerta "The Long Division".

Até hoje, não posso ouvir essa faixa do álbum "Steady Diet of Nothing", de 1991, e logo me recordo dessas ocorrências e da forma dura, mas educada, com que MacKaye resolvia suas questões. O palco para ele era sagrado e até mesmo o 'slam dancing', versão mais agressiva da roda de pogo, era censurado pelo grupo. O punk de Washington, DC não queria que prejudicassem o andamento dos shows e, muito menos, que ameaçassem a integridade física dos fãs mais pacatos.

Mas nem todo mundo é Ian MacKaye. E muitos têm seus momentos de Parker Cannon. Seria destempero? Comportamento irascível? Ou apenas um vacilo numa noite ruim?

Abaixo, três casos de punks norteamericanos que bateram em fãs diante da plateia. E só um deles tinha licença para isso.

>> BEN WEASEL (Screeching Weasel)

O líder da cultuada banda de Chicago não se satisfez em atacar apenas uma mulher durante show ocorrido no festival SXSW, em 2011 - bateu logo em duas! A primeira agressão teria ocorrido após uma integrante da plateia ter, repetidamente, espirrado um tipo de líquido no vocalista. A segunda, depois que outra mulher tentou intervir. A polêmica ganhou destaque na Spin e na Rolling Stone, e Ben "Weasel" Foster se explicou:

"Quero pedir desculpas adono do clube e à integrante do público (...). Ainda que suas ações estivessem fora do meu controle, a reação lamentável é minha total responsabilidade. Quaisquer que sejam minhas opiniões sobre fãs que ultrapassam os limites, eu gostaria de poder voltar atrás e lidar com aquilo da mesma forma com que fiz nos primeiros 60 minutos de show. Como não posso, um pedido de desculpas é tudo o que tenho e espero sinceramente que essas pessoas o aceitem (...). Como marido, pai e músico profissional, entendo que é meu dever assumir a responsabilidade de forma socialmente aceitável, e mais especialmente em face do confronto".

>> FAT MIKE (NOFX)

Durante um show realizado em Sidney, na Austrália, em 2014, o guitarrista e vocalista da famosa banda californiana NOFX perdeu a compostura. Fat Mike empurrou um fã identificado como Alexander Medak e desferiu um pontapé em seu rosto.

No dia seguinte, através do Twitter, Medak enviou uma mensagem para o músico juntamente com uma foto de seu lábio inchado. "Obrigado pelo nocaute, Mike. Não doeu muito. E desculpe por ter te assustado, mas os shows são um pouco diferentes por aqui".

Fat Mike respondeu: "Me desculpe também, Alex. Eu estava com uma dor terrível [no pescoço] durante toda a noite. Quando você me agarrou, eu reagi defensivamente... e ofensivamente. Se você for ao show na sexta-feira, te pago uma cerveja. Só não a jogue em mim".

>> GG ALLIN (GG Allin & The Murder Junkies)

Para o maior terrorista do rock'n'roll, bater em membros da plateia era o mínimo que podia acontecer durante os shows. O público que o acompanhava praticamente pedia por isso. Muitas vezes, Allin arrebentava a fuça de seus fãs. Em outras ocasiões, era espancando e terminava a noite sem dentes e com o braço engessado.

GG Allin, nascido Jesus Christ Allin, passou boa parte dos anos 80 e o comecinho dos 90 metido em confusões. Foi preso, violou a condicional, ficou amigo do serial killer John Wayne Gacy, o famoso "Palhaço Assassino", e terminou expulso de várias cidades e casas de shows. Bateu em fãs de ambos os sexos, sem preconceito, inclusive durante suas palestras niilistas.

O nativo de New Hampshire, que morreu de overdose em 1993, aos 36 anos, nunca pediu desculpas a ninguém. No entanto, uma de suas frases mais famosas pode servir de explicação:

"Minha mente é uma metralhadora, meu corpo são as balas e o público é o alvo".

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Park Cannon age como cafajeste em Toronto:



Ben Weasel apela para a baixaria em Austin:



Fat Mike perde o juízo em Sidney:


    GG Allin desce a porrada em todas as cidades
    (Material NÃO recomendado para leitores mais sensíveis).


    Max Cavalera ao vivo:
    Sepultura 1987 x Soulfly 2016

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    No último domingo, dia 10 de abril, revi, após mais de 20 anos, uma apresentação ao vivo de Max Cavalera. E o cenário não poderia ser mais diferente daquele em que conheci o Sepultura.

    Comparar um show atual do Soulfly com os eventos de metal dos anos 80 é exercício quase antropológico. Primeiro, porque o valor atual dos ingressos seria completamente inacessível para o público de 30 anos atrás. O país mudou e a audiência de Max Cavalera também. O bom público que foi prestigiá-lo no domingo era formado majoritariamente por fãs de meia idade. Bem diferente dos garotos rebeldes do passado e que tinham no metal extremo uma válvula de escape para as agruras da adolescência.

    Outra diferença que grita são as condições técnicas de ontem e hoje. A Audio Club, que recebeu o Soulfly, tem ótima infraestrutura. É possivelmente a melhor casa de shows da cidade desde o fechamento do Via Funchal, em 2012. Tem seguranças por todos os lados, sinalizando com laser aqueles que acendem um cigarro ou um baseado na escuridão. Cobram dez pratas por uma lata de cerveja e oferecem a infame opção de pista VIP, separando o público com uma cerca.

    Já o Sepultura, que vi nos primórdios, tocava com equipamentos baratos e em locais improvisados. Estive em um show do grupo pela primeira vez em 1987, ocasião em que lançavam seu ótimo álbum "Schizophrenia". A apresentação aconteceu nas modestas dependências do Sindicato dos Aeroviários de São Paulo; um prédio de três andares próximo ao Aeroporto de Congonhas. Era parte de um festival chamado "The World's Thrash", que teve outras tantas bandas importantes da época. Em determinada altura, acredite, o evento foi paralisado porque o chimbal da bateria desapareceu. Tinha ido parar, por engano, no meio dos equipamentos da banda punk WCHC.

    Em 2016, Max e seu Soulfly jogam como o craque veterano e acima do peso, o tipo que conhece os atalhos do campo e não precisa suar pra ganhar o jogo. É um tal de mandar a plateia pular, abrir a roda de pogo e bater palmas que não está no gibi. O líder da banda, ungido pela credibilidade do metal "old school", é venerado pelo público. Max pede, os fãs atendem. E sequer precisa tocar sua guitarra rítmica durante boa parte da apresentação.

    Em 1987, o Sepultura era ainda aquele jogador revelação, vindo dos campos esburacados da várzea e que tinha fome de bola. Chamava a atenção por ser melhor e mais habilidoso que seus pares. Em seus shows, não recorria a truques pra ganhar a torcida. Estavam afiados e confiantes, turbinados por um repertório com o frescor e a novidade da época.

    O público de metal atual já flexibilizou seus gostos musicais. Aceita, por exemplo, que Andreas Kisser toque em uma jam session com Junior Lima, o irmão da Sandy, ou que leve o Sepultura para se apresentar em um trio elétrico de carnaval. Na Audio Club, provou isso cantando junto o trechinho de "Polícia", dos Titãs, e o refrão de "Ponta de Lança Africano", de Jorge Ben Jor. Curtiu até uma espécie de reggae chapado, num dos melhores momentos do show.

    O público do passado, radical até o caroço, arrancaria a banda do palco a tapa se fizesse concessões parecidas. Basta dizer que, no citado festival, o Sepultura, assim que subiu ao palco, foi recebido com uma chuva de papel picado. Era o recado da ala mais purista e que já andava desconfiada com os cabelos tingidos dos irmãos Cavalera, suas bermudas floridas e a guinada para o thrash depois de despontarem como uma banda de death metal "from hell".

    Na saída do show do Soulfly, neste domingo, às 23:30, ouvi elogios duvidosos a respeito de Max Cavalera. Enquanto se dirigiam para buscar seus automóveis, fãs falavam do vocalista como um velhinho casca grossa. Estavam, suponho, a valorizá-lo pelos serviços prestados. E talvez, de maneira benevolente, a aceitar que tenha se tornado um animador de festas movidas a covers, citações, pout-porris e velhos clássicos do Sepultura.

    Em 1987, ao final do festival, com o chão do sindicato coberto por garrafas de cerveja e cacos de vidro, o público saiu para as ruas desertas da cidade como uma gangue egressa do filme "Warriors". Se espalharam pelas esquinas e pontos de ônibus abandonados às quatro horas da madrugada. Falavam de metal, das bandas mais obscuras e extremas que existiam. Alguns elogiavam a evolução do Sepultura. Outros, mais críticos e mordazes, lamentavam: "Estão ficando muito comerciais".

    Trinta anos mudam tudo.


    Em 2016, centenas de smartphones filmaram o show do Soulfly.
    Não há registro em vídeo do festival "The World's Thrash" (acima, pôster do evento).
                                                 


    50 canções para gostar de música brasileira



    Revendo as quase 100 colunas publicadas até hoje em Caixa Preta, não há qualquer texto sobre música brasileira. Nem unzinho sequer.

    Existem postagens esparsas sobre artistas nascidos no país, como Redson Pozzi, do Cólera, e Max Cavalera, do Sepultura e Soulfly, mas estes representam um tipo de música específico e que cabe em suas próprias prateleiras.

    Me refiro à música brasileira popular, aos ritmos regionais e ao pop com acento brazuca. Sobre isso, nunca escrevemos. Até agora.

    A partir de uma equação que mistura gosto pessoal, memória afetiva, importância histórica e diversidade, listamos abaixo as 50 canções brasileiras que não podem passar longe do radar.

    Quase não há rock, porque a ideia aqui é outra, mas valem canções de diversas épocas, gravadas por bandas ou artistas solo, e também ritmos estrangeiros que, de alguma forma, tenham se tropicalizado e sofrido influências da nossa cultura.

    Tem "guilty pleasures" de montão e polêmicas prontas. Mas não é uma lista criada com rigor científico e que precise ser levada muito a sério. As canções, bom lembrar, foram separadas por blocos, com base na época em que foram gravadas, no estilo ou na similaridade entre os intérpretes.

    Você pode adorar, detestar ou simplesmente ignorar. É do jogo.

    E para te acompanhar nessa aventura por quase 50 anos em 50 canções, criamos um playlist no Spotify e que está disponível no final do post.

    Às canções: 
    • As Rosas Não Falam - Cartola
    • Iracema - Adoniran Barbosa & Clara Nunes
    • Construção - Chico Buarque
    • O Estrangeiro - Caetano Veloso
    • Parabolicamará - Gilberto Gil
    • Asa Branca - Luiz Gonzaga
    • Wave - Antônio Carlos Jobim
    • Maria Fumaça - Banda Black Rio
    • Swinga Sambaby - Trio Mocotó
    • Rodésia - Tim Maia
    • Ponta de Lança Africano - Jorge Ben
    • Sociedade Alternativa - Raul Seixas
    • Nave Maria - Tom Zé
    • Acabou Chorare - Os Novos Baianos
    • Cavalo de Pau - Alceu Valença
    • Avôhai - Zé Ramalho
    • Canalha - Walter Franco
    • Nego Dito - Itamar Assumpção
    • Agora Só Falta Você - Rita Lee & Tutti Frutti
    • Não Me Venda Grilos (Por Direito) - Odair José
    • O Última Dia - Moska
    • Nostradamus - Eduardo Dussek
    • Será Que Eu Vou Virar Bolor? - Arnaldo Baptista
    • Minha Superstar - Erasmo Carlos
    • Menino do Rio - Baby Consuelo
    • Lindo Lago do Amor - Gonzaguinha
    • Ideologia - Cazuza
    • Fullgás - Marina Lima
    • Trac-Trac - Os Paralamas do Sucesso
    • Nomes Aos Bois - Titãs
    • Rua da Passagem (Trânsito) - Ney Matogrosso
    • Jorgea Corisco - Robson Jorge & Lincoln Olivetti
    • Tem Espaço na Van - Ed Motta
    • Hoje Eu Quero Sair Só - Lenine
    • Vem Dançar Com a Gente - Palavra Cantada
    • O Sol e a Lua - Pequeno Cidadão
    • Pelo Engarrafamento - Otto
    • Parafuso na Cabeça - Rogério Skylab
    • Fora de Si - Arnaldo Antunes
    • A Namorada - Carlinhos Brown
    • Já Sei Namorar - Tribalistas
    • Maracatu Atômico - Chico Science & Nação Zumbi
    • A Carne - Elza Soares
    • Homem na Estrada - Racionais MC's
    • Qual É - Marcelo D2
    • Cartão de Visita - Criolo
    • Sr. Tempo Bom - Thaíde & DJ Hum
    • Babylon By Gus - Black Alien
    • (Funk) Até o Caroço - BNegão & Seletores de Frequência
    • Tombei - Karol Conka feat. Tropkillas